Publicação de poucos artigos em inglês e em colaboração com o exterior afeta a visibilidade dos periódicos nacionais, avaliam especialistas em conferência da SciELO (foto:Wikimedia)
As revistas científicas de países emergentes, como China, Coreia do Sul, Rússia e Brasil, têm intensificado seu processo de internacionalização – que pode ser medido pelo número de artigos publicados em inglês, citação por outros países e pela publicação de artigos de autoria de pesquisadores estrangeiros, entre outros indicadores.
Os periódicos brasileiros, contudo, estão atrás das coleções desses outros países na corrida pela internacionalização, uma vez que ainda publicam menos artigos em inglês e em colaboração com o exterior.
A avaliação foi feita por participantes de um painel sobre medição da qualidade das pesquisas e dos periódicos internacionais, realizado no dia 24 de outubro, durante a conferência de comemoração dos 15 anos da Rede SciELO – Scientific Eletronic Library Online – um programada FAPESP e do Centro Latino-Americano e do Caribe de Informação em Ciências da Saúde (Bireme).
O evento em São Paulo reuniu especialistas em pesquisa e comunicação científica de 25 países para debater a publicação da ciência em acesso aberto e os desafios para o desenvolvimento dos periódicos científicos.
“Há um crescimento da internacionalização dos periódicos dos países emergentes, que pode ser observado no fato de que muitas revistas dessas nações começam a abrir espaço para a publicação de trabalhos de autoria de pesquisadores internacionais”, disse Rogério Meneghini, diretor científico da Rede SciELO, durante o evento.
Meneghini realizou um estudo comparativo da visibilidade internacional de periódicos da China, Coreia do Sul, Brasil, Índia, Rússia e África do Sul nos últimos anos, levando em consideração o número de artigos publicados citados internacionalmente.
O estudo revelou que os artigos publicados nas revistas da China e da Coreia do Sul têm maior impacto, em termos de citação internacional, do que os disponibilizados nos periódicos da Rússia, da África do Sul, da Índia e do Brasil. A coleção de revistas científicas brasileiras ficou em quinto lugar nesse quesito entre os seis países emergentes analisados, à frente apenas da África do Sul.
“As revistas científicas brasileiras ainda estão publicando um menor número de artigos em inglês do que os periódicos desses quatro outros países emergentes. Isso traz menos visibilidade internacional”, disse Meneghini.
“Esse é um parâmetro importante, e que podemos controlar mais facilmente, para possibilitar que os periódicos brasileiros tenham maior visibilidade internacional”, avaliou.
Em comum, segundo Meneghini, esses países publicam uma grande quantidade de artigos de autores nacionais – que representam, no total, 6% dos artigos indexados na base Web of Science. E seus periódicos têm como um de seus objetivos escoar produções científicas que, muitas vezes, não encontram espaço nas publicações internacionais.
Para aumentar esse escoamento, nações como a China recorrem aos periódicos do Brasil e de outros países emergentes. A China é um dos que mais citam artigos publicados em periódicos brasileiros e submete estudos para revistas brasileiras realizados, em sua maioria, só por pesquisadores chineses, sem colaboração internacional, ressaltou Meneghini.
“É muito claro, no caso da China, que eles têm uma produção científica imensa, que não encontra aceitação em periódicos internacionais de maior destaque, e estão procurando espaço para publicação que não possuem nem dentro do próprio país”, disse.
“Por isso, o país recorre a publicações de outras nações, como o Brasil, como pode ser atestado pela quantidade de artigos de autoria de pesquisadores chineses recebidos pelos editores de revistas brasileiras”, disse Meneghini.
As revistas brasileiras que mais publicaram artigos de outros países em 2010 e 2011, segundo Meneghini, foram a Genetics and Molecular Research e o Journal of the Brazilian Chemical Society. No caso da primeira, dois terços das publicações da revista – que não está indexada na base da SciELO Brasil – são de autoria de pesquisadores estrangeiros.
“Nos últimos dez anos, os países avançados aumentaram duas vezes a publicação nos periódicos das nações emergentes, como os do Brasil”, disse Meneghini. “Por outro lado, esses países emergentes aumentaram dez vezes a publicação nos periódicos brasileiros.”
Já entre os periódicos brasileiros mais citados por outros países estão o Latin American Journal of Solids and Structures, o Brazilian Journal of Chemical Engineering e oThe Brazilian Journal of Infectious Diseases – os três indexados na base da SciELO Brasil.
“É interessante que dois desses três periódicos brasileiros mais citados internacionalmente sejam da área de Engenharia de Materiais, ao contrário dos outros países emergentes, onde as revistas nacionais mais citadas são das áreas de Biologia e Medicina”, comparou Meneghini.
Pouca colaboração internacional
De acordo com outros especialistas participantes do evento, não há um levantamento oficial do total de revistas científicas publicadas pelo Brasil atualmente. Estima-se que existam 8 mil periódicos brasileiros em atividade – número considerado muito alto.
“Essa grande quantidade de revistas talvez cause efeitos de dispersão e de nivelamento por baixo da qualidade dos artigos científicos publicados em periódicos brasileiros”, disse Isabelle Reiss, gerente de contas da divisão de pesquisa científica da Thomson Reuters para a América do Sul. Segundo ela, uma menor quantidade de periódicos brasileiros tornaria a seleção de artigos mais rigorosa e, consequentemente, aumentaria a qualidade e a visibilidade dos trabalhos publicados.
Outro fator que influencia a baixa visibilidade dos trabalhos publicados por pesquisadores brasileiros, de acordo com Reiss, é a pouca colaboração com pesquisadores de outros continentes e da própria América Latina.
Na avaliação dela, isso pode estar relacionado ao fato de a ciência brasileira ainda ser muito jovem [em comparação com países da Europa ou os Estados Unidos].
Reiss também comenta baixo número de artigos de revisão de literatura – voltados a fazer um levantamento dos avanços em uma determinada área do conhecimento – publicado nas revistas brasileiras.
“Os artigos de revisão são escritos por pesquisadores muito informados, com experiência acumulada de muitos anos em suas respectivas áreas”, disse.
“Em geral, esse tipo de artigo gera muito mais citações do que o de resultados de estudos, porque apresenta uma síntese inteligente do atual estágio de desenvolvimento de uma determinada área do conhecimento, que será utilizado por diversos outros pesquisadores”, disse Reiss.
Quando os artigos de revisão são escritos em colaboração com pesquisadores do exterior, o número de citações pode até ser duplicado, afirmou a especialista.
Por isso, as revistas brasileiras deveriam publicar mais esse tipo de artigo, que representa apenas 2,4% dos trabalhos publicados, estimou Reiss.
“As revistas brasileiras poderiam tentar identificar dentro de suas áreas pesquisadores muito experientes para escrever essas sínteses, a fim de aumentar a visibilidade”, indicou.
Integração na Web of Knowledge
Durante o evento, a divisão de propriedade intelectual e ciência da Thomson Reuters anunciou uma parceria com a SciELO para integrar o SciELO Citation Index (índice de citação da SciELO) na Web of Knowledge – plataforma que permite o acesso a várias bases de dados de referência bibliográfica, como a Web of Science, Current Contents Connect e Journal Citation Reports (JCR), tanto para busca como para geração de indicadores bibliométricos.
Na avaliação das instituições, a iniciativa vai proporcionar maior visibilidade e melhor acesso à pesquisa dos 15 países ibero-americanos e da África do Sul, cujas coleções estão indexadas na base da Rede SciELO.
“O acordo com a Web of Knowledge abre novos horizontes na missão da SciELO de melhorar a visibilidade da ciência que é feita na América Latina, Espanha, Portugal e África do Sul”, declarou Carlos Henrique de Brito Cruz, diretor científico da FAPESP, em um comunicado conjunto das três instituições, anunciando o lançamento da iniciativa.
O SciELO Citation Index incluirá, aproximadamente, 650 títulos e mais de 4 milhões de referências citadas de periódicos de acesso livre da Argentina, Brasil, Chile, Colômbia, Costa Rica, Cuba, México, Portugal, África do Sul, Espanha e Venezuela.
“Há uma vasta quantidade de conteúdo científico valioso gerada e publicada por periódicos de regiões emergentes, como a América Latina, Caribe e África do Sul, e é importante que esse trabalho esteja visível e possa ser acessado globalmente”, afirmou Abel Packer, diretor da SciELO, no comunicado.
De acordo com a Thomson Reuters, a adição da SciELO na Web of Knowledge seguirá um modelo semelhante ao do Chinese Science Citation Database, que está hospedado na Web of Knowledge desde 2008, e do lançamento planejado para 2014 de um banco de dados de periódicos com literatura acadêmica coreana.
“Para nós, é um prazer colaborar com a SciELO para promover o alcance de pesquisas importantes de regiões emergentes, bem como para aumentar os nossos próprios dados ao integrar conteúdo de alta qualidade e acesso livre na Web of Knowledge”, afirmou no comunicado Christopher Burghardt, vice-presidente de negócios de pesquisa acadêmica e científica da Thomson Reuters.
FONTE: FAPESP
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