Desafio de comunicação científica é diferente do enfrentado por países como o Brasil, apontam especialistas (foto: Eduardo Cesar/FAPESP)
Apesar de ser um dos países líderes em ciência no mundo, a Alemanha esteve durante muito tempo em uma posição secundária em relação às nações anglo-saxônicas em matéria de divulgação científica, afirmou Peter Steiner, coordenador da exposição científica Túnel da Ciência Max Planck, aberta ao público no dia 29 de janeiro no Centro de Convenções do Shopping Frei Caneca, em São Paulo.
Nos últimos anos, no entanto, os órgãos de financiamento à ciência do país europeu têm feito esforços para superar essa diferença e divulgar mais e melhor ao público geral os resultados das pesquisas desenvolvidas nas instituições científicas alemãs, contou Steiner durante uma mesa-redonda sobre divulgação científica no Brasil e na Alemanha realizada no dia 28 na capital paulista.
O encontro foi organizado pelo Centro Alemão de Ciência e Inovação São Paulo (DWIH-SP) e pela Sociedade Max Planck, em parceria com o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) e o Serviço Alemão de Intercâmbio Acadêmico (DAAD), e fez parte de uma programação complementar de atividades da exposição científica, que segue até o dia 21 de fevereiro, com entrada franca.
Criada em 2000, a exposição já passou por mais de 20 países em cinco continentes e recebeu mais de 9 milhões de visitantes. Em 2007, foi realizada simultaneamente na África do Sul e na Índia – onde ocorreu em um trem, batizado de “Expresso da Ciência”, que percorreu diferentes cidades do país.
“Na Alemanha, 80% dos pesquisadores publicam rotineiramente os resultados de seus trabalhos em revistas científicas ou os apresentam em congressos de suas respectivas áreas para os seus pares, mas pouquíssimos realizam atividades de divulgação científica para comunicar as descobertas de suas pesquisas ao grande público”, disse Steiner, gerente de exposições da Sociedade Max Planck.
“Nos últimos anos, contudo, têm sido feito esforços para as instituições de pesquisa da Alemanha tornarem-se mais ativas no campo da divulgação científica”, afirmou Steiner, que foi pesquisador na Universidade de Tübingen e no Museu Alemão em Munique.
De acordo com Steiner, a liderança dos países anglo-saxônicos, como os Estados Unidos e a Inglaterra, em divulgação científica pode ser ilustrada pelo fato de a maioria das expressões da área ter sido cunhada em inglês, como public understanding of science (“percepção pública da ciência”).
A partir do início dos anos 2000, porém, começou-se a trabalhar na Alemanha com um conceito próprio de divulgação científica, denominado “diálogo científico”. A ideia, segundo Steiner, é estimular o contato dos cientistas com o público geral, de forma a diminuir a barreira de comunicação existente entre eles.
“Há muitos cientistas na Alemanha que acham que devem apenas fazer ciência e não divulgá-la”, disse Steiner. “Os resultados dos trabalhos científicos, contudo, têm se tornado cada vez mais abstratos e difíceis de serem entendidos pelo público leigo. É necessário que eles sejam mais conhecidos e compreendidos pela opinião pública, para que a ciência seja legitimada democraticamente.”
Iniciativas de divulgação
Segundo Steiner, uma das iniciativas de divulgação científica surgidas em seu país nos últimos anos são os “anos da ciência”. Promovido anualmente pelo Ministério Federal de Educação e Pesquisa (BMBF) da Alemanha, o evento tem um tema diferente a cada ano.
Outras ações recentes, de acordo com Steiner, são exposições científicas a bordo de navios e trens que percorrem diferentes regiões da Alemanha.
“Algumas instituições de pesquisa alemãs também costumam promover periodicamente o evento chamado ‘Portas Abertas’, no qual convidam o público a visitar seus laboratórios e mostram como se faz ciência”, afirmou.
“A Sociedade Max Planck, por exemplo, abre regularmente os laboratórios, bibliotecas e oficinas de seus institutos de pesquisa para o público e é uma das únicas instituições de pesquisa no mundo a realizar exposições científicas como o ‘Túnel da Ciência’”, disse.
Em sua terceira versão, a exposição multimídia utiliza fotografias, textos, vídeos e animações para retratar o atual estágio, os desafios e os resultados científicos obtidos por pesquisadores da instituição em diferentes áreas, como Astronomia, Biologia, Saúde e Energia, entre outras.
“Conseguimos apresentar, com a exposição, um bom panorama do trabalho científico realizado nos 82 institutos de pesquisa da Sociedade Max Planck, que possui mais de 5,3 mil pesquisadores e já recebeu 17 prêmios Nobel”, destacou Steiner.
De acordo com ele, a primeira edição da exposição, na Alemanha, ficou em cartaz sete meses e atraiu centenas de visitantes. Com o sucesso inicial, eles decidiram torná-la itinerante e levá-la a diferentes partes do mundo, como a China e a Rússia, por meio de patrocínio de empresas e instituições locais.
Realidade brasileira
Segundo Ildeu Moreira, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), que também participou da mesa-redonda, no Brasil uma série de ações de divulgação científica foi promovida nos últimos anos, entre elas a Semana Nacional de Ciência e Tecnologia, Olimpíadas e feiras de ciência.
O desafio, contudo, é melhorar a qualidade da divulgação científica no país e, ao mesmo tempo, atingir um número maior de pessoas. “O amplo espectro de atividades de popularização da ciência no Brasil atinge, no máximo, de 20 a 30 milhões de brasileiros que têm televisão a cabo e acesso a livros, revistas de divulgação científica e eventos científicos”, estimou.
“É preciso que essas atividades de divulgação científica cheguem a locais onde a informação sobre ciência dificilmente chega. Para isso, temos de usar todos os meios de comunicação e fazer uma distribuição mais adequada dos espaços de ciência pelo território brasileiro”, disse Moreira.
Segundo ele, recentemente houve um aumento no número de museus e espaços relacionados à ciência, como planetários e jardins zoológicos ou botânicos e na visitação a esses espaços no Brasil. Essa visitação, no entanto, ainda corresponde a um terço da média europeia, comparou.
“Os museus e os espaços de ciências em São Paulo e no Rio de Janeiro, por exemplo, ainda estão concentrados [em determinadas regiões] e milhões de pessoas que moram na periferia dos grandes centros raramente têm acesso a exposições de ciência que, por direito, deveriam ter”, disse.
O pesquisador também apontou que o desafio de realizar divulgação científica no Brasil é maior do que o enfrentado pela Alemanha, em razão, principalmente, das diferenças educacionais entre os dois países.
Enquanto na Alemanha a divulgação científica é feita em um país com educação de alto nível, no Brasil a qualidade do ensino – em especial, o de ciências – é muito deficiente, apontou.
“O ponto fundamental para a divulgação da ciência, na minha opinião, é a educação científica de qualidade”, disse Moreira. “A baixa qualidade da educação científica no Brasil torna mais desafiadora e ainda mais necessária a divulgação da ciência, uma vez que ela ajuda a complementar a educação científica.”
Estímulo à pesquisa colaborativa
No dia 30 de janeiro, Stefan Marcinowski, vice-presidente da Sociedade Max Planck, na Alemanha, e Andreas Trepte, chefe da representação da instituição, estiveram na sede da FAPESP, para discutir formas de cooperação entre as duas instituições.
Acompanhados por Ralf Heinkele, cônsul alemão para assuntos culturais e de ciência, foram recebidos por Celso Lafer, presidente da FAPESP, Eduardo Moacyr Krieger, vice-presidente, e por Carlos Henrique de Brito Cruz, diretor científico.
Leia mais em: www.fapesp.br/8433
FONTE: FAPESP
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