Mais Médicos e Pacto pela Alfabetização são alguns dos projetos mais recentes que exigem trabalho das instituições. Representantes dizem que universidades têm boa vontade em colaborar, mas estão ‘no limite’
As universidades estão cada vez mais sobrecarregadas pela quantidade de solicitações feitas pelo governo federal. Os ministérios têm desenhado programas que dependem da ajuda delas para serem executados, baseados nas três frentes de trabalho que formam os pilares das universidades brasileiras: ensino, pesquisa e extensão. Além de formar bons profissionais, devem promover inovação e interagir com a sociedade para solucionar problemas reais.
“Esse é o custo de ser reconhecido pela qualidade do trabalho. A vontade de colaborar é real, mas os meios não são apropriados. Sinto que a disposição das universidades está no limite”, diz o secretário-executivo da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes), Gustavo Balduíno. Ele ressalta que os programas são voluntários e, por isso, as instituições evitam reclamar. Mas reconhece dificuldades na execução das ações.
Agência Brasil
Universidades reclamam de sobrecarga para atender demandas do governo federal
Muitos dos recentes programas anunciados pelo governo federal – como o Mais Médicos; o Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa (Pnaic); Quero ser professor, quero ser cientista – exigem a formação de profissionais, o monitoramento das ações e a avaliação delas pelas universidades. Mas outros projetos, especialmente de formação de professores, já são tocados pelas instituições, muitas vezes também em parcerias com governos locais.
Representantes de instituições ouvidos pelo iG têm avaliações semelhantes: as demandas da sociedade são muitas, importantes e urgentes, e as universidades têm o dever de participar das transformações necessárias. No entanto, admitem que as tarefas não são simples de serem executadas e a sobrecarga de trabalho para algumas, que ainda estão em fase de expansão, é inevitável.
ara a professora Célia Giglio, da pró-reitoria de Graduação da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), a expansão das instituições federais iniciada em 2007 era sinal de que elas fariam parte de uma rede de indução de políticas federais. “Demandas antes inexistentes aparecem ao mesmo tempo em que a expansão se consolida. Parece exorbitância, mas tendo em vista a autonomia das universidades, não é inadequado”, opina.
Há instituições mais radicais na discordância da forma como o governo solicita apoio das universidades. Jorge Coimbra, pró-reitor de Graduação da Universidade Federal de Rondônia (Unir), critica a quantidade e a forma de “indução” do governo à participação nos projetos. “As universidades estão se transformando em uma grande loja de conveniências de programas governamentais e perdendo o próprio foco”, esbraveja.
Com a distribuição de bolsas para professores e alunos, que atuam como tutores e monitores da grande maioria, Coimbra acredita que o governo cria “transtornos” para as universidades. “É uma situação complicada. Porque a tendência dos conselhos é não aderir aos programas, mas os professores e técnicos, por causa das bolsas, querem participar. Isso cria problemas políticos internos e depois dificuldades para administrar”, diz.
Demandas demais, estratégias de menos
Para Coimbra, os órgãos tradicionais dos governos perderam a capacidade de operação nos municípios e, por isso, dependem das universidades para executar ações. “A demanda é grande e legítima, mas há riscos de comprometermos os resultados”, afirma.
“Faz parte da missão da universidade e elas têm feito um esforço grande com um corpo reduzido de professores e técnicos para serem parceiras do desenvolvimento nacional e local. O mesmo docente ministra aula na graduação, na pós, na extensão, participa dos projetos. A sobrecarga é muito grande, precisa de mais gente, recursos, infraestrutura”, completa Ana Cabral, pró-reitora para Assuntos Acadêmicos da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).
Os gestores lembram que, para serem eficientes, os projetos precisam fortalecer as universidades. Mais professores e, especialmente, mais técnicos administrativos para acompanhar os projetos são pleiteados. A reitora da UniversidadeFederal do Rio Grande do Norte (UFRN), Angela Maria Cruz, conta que o apoio logístico é a maior dificuldade da instituição, que participa de todos os programas.
A falta de debates prévios sobre as propostas entre instituições e governos também é reclamação entre os dirigentes. Qualquer participação em projeto exige aprovação dos conselhos universitários, mas o governo estabeleceu prazos para a decisão. O pró-reitor de Administração e Finanças (e futuro reitor) da Universidade Federal de Goiás (UFG), Orlando Afonso Amaral, reconhece que, sem a urgência imposta, as discussões demorariam demais. Mas lamenta a falta de tempo para convencimento da comunidade acadêmica.
“A gente tem plena consciência que o tempo da universidade e o do governo são diferentes. O governo tem mais pressa para realizar e atender as carências que precisa suprir. Temos de procurar um equilíbrio, mas facilitaria muito o trabalho se o MEC, ao pensar nesses programas, envolvesse mais a comunidade. As resistências seriam menores, a implantação mais tranquila e os resultados, melhores”, pondera Amaral.
As resistências da comunidade acadêmica, em Goiás, chegaram ao Mais Médicos. Até o momento, a instituição não decidiu se e como vai participar. Segundo Amaral, as conversas no departamento de Medicina caminham para uma aceitação do projeto. “Há um sentimento de que há demandas demais e pouca instrução prévia. Existem divergências em relação ao programa, mas a perspectiva é a de participar”, conta.
Outra dificuldade apontada por Ana Cabral é a legislação que controla os gastos dos recursos. A burocracia – que demanda tempo de execução de compras, por exemplo – atrapalha a aplicação mais rápida do dinheiro. “As dificuldades dos processos imobilizam e o governo sabe disso. Nossa legislação não pode continuar como está. É estrangulatório”, critica.
Consensos
Os projetos que contribuem para as atividades-fim das universidades – ensino, pesquisa e extensão – são consenso entre os docentes. Dificilmente, os projetos idealizados para a formação continuada dos professores da educação básica, por exemplo, encontra resistência. Isso porque as ações vão contribuir para a formação dos próprios universitários.
A visão de que essa é uma oportunidade de melhorar o ensino oferecido nas licenciaturas é o que faz a UniversidadeEstadual Paulista (Unesp), mesmo não fazendo parte da rede federal, querer contribuir. Laurence Colvara, pró-reitor de graduação da Unesp, diz que a “sintonia” entre as atividades da instituição e os programas justificam a adesão. “O programa que der oportunidade de desenvolvimento para os alunos e fortalecimento das nossas licenciaturas vai atrair interessados em participar sempre”, garante.
Sandra de Deus, pró-reitora de Extensão da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), também é categórica ao afirmar que os projetos do MEC na área de extensão são demandas antigas dos gestores da área. “Durante muito tempo, corremos atrás desses editais. Agora que existem, estamos colocando nossa força. Isso não é um peso, é uma atividade-fim”, sentencia.
FONTE:ultimosegundo.ig
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