quarta-feira, maio 21

GESTÃO: Em busca de motivos

Observar as razões que engajam os colaboradores é o primeiro passo para o aumento da produtividade


Getty Images


Estudos apontam que a baixíssima produtividade brasileira vem enfraquecendo a economia local. Estamos atrás de países como Argentina e Peru em rankings que medem a competitividade global. A conjuntura econômica favorável para mudar esse cenário até existe – só no estado do Rio de Janeiro, espera-se o aporte de 311 bilhões de reais na economia, gerando 300 mil novos empregos. Qual é então o entrave brasileiro que dificulta o ganho de produtividade? Para especialistas em gestão de pessoas, a resposta é simples: pessoas desmotivadas. “O trabalho precisa, de fato, trazer sentido, ou melhor, significado para as pessoas; se não for assim, elas deixam o ambiente que não observa essa necessidade”, defende a consultora Jacqueline Arruda, coordenadora do Comitê Temático do Congresso RH-RIO. 

Poucas empresas estão atentas a esse cenário. Segundo a consultora, o erro começa pelo conceito equivocado do termo “produtividade”, que é traduzido como o que o profissional produz e que gera valor para a organização. Jacqueline explica que empresas que buscam exclusivamente benefícios para si e não consideram, como prioridade, o investimento no sonho de seus colaboradores dizimam a capacidade humana de produção de suas equipes. Não se trata de uma opinião, mas de constatação. Pesquisas no mundo inteiro confirmam que as empresas que dividem lucros e conquistas com os empregados se perpetuam no mercado.

Gap educacional
Marta, da Fundação Dom Cabral: educação de qualidade e democrática

Além desse aspecto, outro fator limitante é a qualidade educacional do país. “A produtividade na força de trabalho não vai ser acelerada enquanto a educação de qualidade não for democrática, para todos”, alerta Marta Pimentel, gerente-coordenadora dos programas abertos da Fundação Dom Cabral (FDC). Mas há uma luz no fim do túnel. Psicóloga com pós em gestão de RH, Marta vê, hoje, um empresário mais maduro para lidar com o lado humano da produtividade, até mesmo em função dos problemas sociais, ambientais e econômicos pelos quais não apenas o Brasil, mas o mundo está passando. 

E dividir conquistas e fomentar a educação são ações caras para a empresa? Não, de acordo com alguns especialistas. Eles defendem que, muitas vezes, uma inovação “com as pessoas” e não “para as pessoas” tem custo menor e traz resultados mais interessantes. Por exemplo: um trabalhador precisa entender por que está acordando às cinco da manhã para se deslocar por horas até o trabalho, realizar atividades, por vezes rotineiras, e voltar tarde para a sua casa. Deve sentir que, depois de muito esforço e alguma dor de cabeça, ele realizou algo que não trouxe apenas satisfação financeira (que é importante), mas algo do qual ele pode se orgulhar de ter produzido. Ações de reconhecimento, financiamento de cursos, promoções internas, planos transparentes de meritocracia podem ser boas respostas a tais anseios.

Isso é o que se chama de propósito de engajamento, um passo decisivo na construção da produtividade tão humana quanto econômica. Para Luiz Augusto Costa Leite, sócio da Change Consultoria e também membro do Comitê Temático do Congresso RH-RIO, profissionais de RH podem contribuir para esse engajamento a começar pela análise de indicadores. O consultor defende que área deve observar o potencial de entrega das pessoas e abandonar dados “ultrapassados”, tais como rotatividade (turnover) e absenteísmo. “Precisamos saber o que está por trás dos custos e o fato é que uma série de resultados de uma empresa depende da entrega de suas pessoas”, justifica Costa Leite.

Motivação da força de trabalho

E essa “entrega”, como acentua Marco Dalpozzo, não depende apenas dos chamados “talentos”, mas de todos. “Produtividade humana é o RH trabalhar para que todo mundo esteja mais motivado, envolvido. Os talentos talvez somem 15% da empresa; o que é muito pouco. Medir e acompanhar talentos são ações válidas, mas insuficientes em termos produtivos. É preciso investir em ações reais que somem as capacidades de todos da organização”, argumenta. Com experiência à frente do RH de empresas como Parmalat, Vale e L’Oréal, Dalpozzo garante que mesmo em funções com procedimentos repetitivos é sempre possível encontrar profissionais “a fim de mostrarem um pouco mais”. O RH é decisivo nesse ponto, ao dar um feedback constante aos colaboradores, não importa de que funções sejam. O executivo descobriu outro detalhe importante: não faz diferença se você é um intelectual ou um mecânico; o fato é que ambos produzem com a mesma qualidade se conseguirem “enxergar seu trabalho como algo em que estão colocando a sua autoria”.
Marco Dolpozzo
Dalpozzo: o RH deve trabalhar pela motivação das pessoas 

Dalpozzo deixa claro que nesse processo é preciso que o RH entenda em qual negócio está inserido e onde estão os profissionais com mais dificuldade e necessidade de se sentirem e serem produtivos. Segundo ele, em uma empresa de consumo, como a L’Oréal, os profissionais que estão colocando os produtos nas gôndolas do supermercado são extremamente especiais. “Afinal, são eles que definem a visualização do produto para os clientes. É ali que se traduz o esforço do marketing, da produção. Mas, em geral, damos pouca relevância a eles”, alerta.

Exemplo de sucesso

Dalpozzo narra um exemplo marcante de construção humana da produtividade da época em que esteve à frente do RH da mineradora Vale. O consultor conta que não estava muito claro para os cerca de 1,6 mil supervisores da empresa qual seria exatamente o futuro de carreira de cada um. A solução encontrada para a questão foi dar mais transparência à estrutura do plano de carreira. Para tanto, foram ampliados os critérios de ascensão ao incluir avaliações de performance e potencial, estimulando a satisfação dos supervisores em ter seu trabalho reconhecido. “Quando está plenamente ciente de seu papel na organização, a pessoa tem mais vontade de fazer parte de um projeto, pois sabe que seu trabalho também estará assinado no legado da empresa”, aponta.
Ações como essa são medidas e dimensionadas pelas empresas? Nem sempre. Dalpozzo e Costa Leite entendem que muitos gestores não pensam em satisfação das pessoas. Costa Leite destaca, por exemplo, que muitas ferramentas de RH, por mais modernas que sejam, como a avaliação de desempenho, ainda não fazem uma leitura precisa da real eficiência do ser humano. “Precisamos debater como essas avaliações podem chegar ao âmago de cada funcionário em relação à sua satisfação em trabalhar”, diz. 


Para ter pessoas produtivas e um RH que proporcione essa realidade, as empresas devem se preocupar também em definir, segundo Jacqueline Arruda e Costa Leite, o que seria “um gerente ou diretor produtivo”. Isso significaria praticar o exercício contínuo de responder a perguntas como: esse líder está ouvindo as áreas (e não apenas os talentos)? Com qual periodicidade? Como o investimento em educação corporativa está retornando em ideias, projetos e ações? Quantos projetos inovadores os líderes estimularam entre seus líderados que deram certo em sua implementação?



No lugar do outro

Jacqueline Arruda
Jacqueline: observar as necessidades de cada colaborador

Para Marco Dalpozzo, a questão pode ser resumida em uma palavra: atitude. “É preciso ter a atitude de se colocar no lugar do outro e fazer isso de forma envolvente; quando o seu profissional está à vontade, é claro que vai produzir o melhor de si”, ratifica. Jacqueline complementa esse raciocínio ao afirmar que não é possível uma companhia sair da situação em que está com as mesmas soluções. É preciso envolver os funcionários em todos os significados de produtividade. “Apenas estando engajados eles irão inovar.”

Líderes têm atitude quando dispõem do suporte da autoconfiança, sentimento que também se consegue quando o RH investe em seu conhecimento. Marta Pimentel, da FDC, acredita que uma pessoa com mais base educacional está mais autoconfiante para investir em si mesma. “E essa autoconfiança faz com que ela arrisque mais, inove e, ao fazer isso, aumente a sua produtividade”, explica. Ela cita até o exemplo de uma gestora que, antes de um curso que estava prestes a fazer, admitia certo medo de exercer a liderança, dizendo que, após as aulas, conseguiu mobilizar seus liderados a fazer coisas que não imaginava ser possível.

FONTE: RevistaMelhor

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