Nos cursos, os estudantes esperam que você lhes dê “a resposta”... Mas isso nem sempre é sinal de fazer a coisa certa
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“Ok, Jack, agora você está na Matsushita: o que vai fazer?” O professor e os 87 colegas de Jack aguardam ansiosamente sua resposta à inesperada convocação. Jack está preparado; pensara nessa situação durante muito tempo, desde quando lhe disseram que o método de estudo de caso propunha-se a “desafiar o pensamento convencional”. Disseram-lhe também, repetidas vezes, que os bons gestores são decisivos – logo, bons estudantes de MBA precisam tomar posição. Assim, Jack respira fundo e responde.
“Como posso responder a essa questão?”, começa. “Até ontem, mal havia ouvido falar da Matsushita. E hoje o senhor quer que me pronuncie sobre a estratégia da empresa...”.
“Na noite passada, tinha dois outros casos para preparar. Para a Matsushita, com suas centenas de milhares de empregados e milhares de produtos, levei algumas horas. Li o caso rapidamente e depois o reli, digamos, não tão rapidamente. Que eu saiba, jamais usei algum de seus produtos (até ontem nem sequer sabia que a Matshushita fabrica a Panasonic). Jamais visitei qualquer uma de suas fábricas. Jamais estive no Japão. Jamais conversei com algum de seus clientes. Certamente não conheço nenhuma das pessoas mencionadas no caso. Além disso, o assunto envolve alta tecnologia e sou o típico sujeito ‘subtecnológico’. Adquiri minha modesta experiência profissional numa fábrica de móveis. E tudo o que preciso fazer é percorrer essas 20 páginas. Esse é um exercício superficial. Recuso-me a responder a sua pergunta!”.
O que terá acontecido a Jack? Deixarei que você adivinhe. Mas dali, Jack retorna ao negócio de móveis, onde mergulha em seus produtos e processos, conhecendo a fundo as pessoas e o setor. É particularmente um grande fã de sua história. Aos poucos, com a coragem de ser decisivo e desafiar o pensamento convencional, ele ascende ao posto de CEO da empresa. Lá, sem praticamente qualquer análise setorial (o que viria em um curso posterior), ele concebe uma estratégia que transforma o setor.
Enquanto isso, Bill, que está sentado ao lado de Jack, toma a palavra. Ele também jamais esteve no Japão (embora soubesse que a Matshushita fabrica a Panasonic). Bill emite uma ou duas observações inteligentes e garante seu MBA. O MBA lhe garante emprego numa prestigiada firma de consultoria, onde, como nas aulas de estudo de caso que frequentara, ele passa sucessivamente de uma situação a outra, sempre emitindo uma ou duas observações inteligentes sobre assuntos que ignora por completo, e sempre partindo antes de sua implementação. Conforme vai acumulando esse tipo de experiência, não demora até que se torne diretor-executivo de uma grande empresa de utensílios (jamais prestara consultoria para esse tipo de empresa, mas lembrou do caso da Matshushita). Lá chegando, formula uma elegante estratégia de alta tecnologia, implementada mediante um radical programa de aquisições. O que terá acontecido? Adivinhe de novo.
Os leitores (do livro de Kelly What They Really Teach You at the Harvard Business School) devem estar se perguntando – ler o caso e fazer essa análise em duas a quatro horas? Sim, é a resposta da Harvard. Os estudantes precisam preparar dois a três casos por dia... Logo, precisam suar a camisa para concluir suas análises de maneira rápida e, ao mesmo tempo, eficiente.
O desempenho dos melhores de Harvard
No começo dos anos 2000, topei com o livro Inside the Harvard Business School, um livro de David Ewing, publicado em 1990. Ewing acreditava ser a pessoa certa para escrever uma obra como essa, já que tivera a oportunidade de “observar internamente a escola por quatro décadas, tendo conhecido pessoalmente a maior parte de seus líderes, lecionado e participado de muitas de suas lutas”. Assim, partindo do “ponto de vista de um insider”, ele tratou de “responder algumas questões” (entre elas: por que a escola “tornou-se” tão “importante”?).
Já nas primeiras páginas do livro, Ewing apresenta uma lista dos alunos de Harvard que “chegaram ao topo” do mundo dos negócios – 19 pessoas ao todo, supostamente os superstars da instituição. Uma amostra tendenciosa como poucas. Por isso mesmo decidimos utilizá-la. (Joe Lampel juntou-se a mim na análise).
Tínhamos a vantagem da visão em retrospecto: mais de uma década se passara desde a publicação da lista... “O verdadeiro teste da [Harvard Business School] está... no desempenho de seus alunos”, escreve Ewing. Qual, então, terá sido o desempenho desses ditos melhores alunos de Harvard – não para chegarem ao topo de suas organizações, mas à frente de sua gestão?
Numa palavra: ruim. Consultando os registros de fins de 2003... 10 dos 19 parecem claramente ter fracassado (o que significa dizer que suas empresas foram à falência, eles foram demitidos do posto de CEO, uma grande fusão foi por água abaixo, etc.) O desempenho de outros quatro poderia ser considerado questionável, para dizer o mínimo. Alguns desses 14 CEOs construíram ou reconstruíram empresas – em movimentos notáveis e radicais – apenas para vê-las enfraquecer ou sucumbir dramaticamente. Nenhum dos 14 deixou atrás de si um empreendimento sólido e sustentável.
Há uma tendência quase sempre fatal de se buscar uma fórmula – algum tipo de técnica genérica – desconsiderando quaisquer nuances e a despeito das pessoas e dos problemas de execução. Ao que parece, estudantes inexperientes que procuram aplicações “práticas” na sala de aula acabam por se tornar gestores incoerentes que buscam respostas fáceis no exercício da função.
Logo, o que podemos concluir com isso? Não que o MBA seja um grau disfuncional que arruíne todos que o obtenham; há graduados nesses programas que obtiveram sucesso em suas carreiras, assim como outros que fracassaram tristemente. As evidências que apresentamos aqui não são definitivas, mas deveriam nos fazer desconfiar desse influente título. Ter um MBA não deveria qualificar as pessoas para a gestão mais do que desqualificá-las. No entanto, os dados que fornecemos certamente deveriam fazer soar o alarme: o MBA confere vantagens importantes a muitas pessoas erradas. Em outras palavras, as pessoas precisam adquirir suas cicatrizes gerenciais no trabalho – um processo que não deve ser acelerado na sala de aula. Nenhuma empresa deve tolerar a “via expressa”.
| Texto extraído do livro: Management: não é o que você pensa
FONTE: Administradores
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